Dizem que os Border são aqueles chamados de Ovelhas Negras... sempre achei as ovelhas negras as pessoas mais normais e certas do que muitos "normais".
Nunca fui do tipo que dava trabalho na adolescência, não tive muitos namorados, não era de fumar ou beber de dar show, minhas rebeldias se resumiam a sair escondido dos mais pai para ir em baladas, de ter amizades com pessoas que não eram da igreja (já que cresci na igreja e meu pai é pastor), gostar de rock e não ser um primor de filha - delicada, atenciosa, companheira, feminina, prestativa, blablabla...
Me lembro de uma época no final da minha adolescência que fiquei um tempo sem falar com meu pai e ele comigo. Minha mãe quase enlouqueceu. Não entendia como aquilo era possível, já tinha lido vários livros sobre relacionamento, adolescentes problemáticos, famílias desestruturadas e não entendia como uma menina que teve de tudo, recebeu tudo do bom e do melhor, que não foi educada daquela maneira agora parecia outra pessoa.
Não tenho muitas recordações de momentos específicos, mas os poucos que tenho guardados parecem como se tivessem acabado de acontecer. Nunca saiu da minha cabeça a cena quando meu pai me chamou na sala para conversar sobre a situação, eu sentei no sofá enquanto minha mãe estava sentada numa cadeira de frente pra mim e ele em pé atrás dela. Sabe aquelas fotos antigas de casais onde os dois estão olhando para o horizonte, o homem em sua virilidade e a esposa em sua submissão "felizes". Daquela conversa a única memória que tenho é dessa cena e de suas palavras: "olha pra você, se continuar assim não terá ninguém do seu lado, eu e sua mãe temos um ao outro, mas você não tem ninguém."
Verdade, talvez essa tenha sido a maior verdade que um pai pode assumir a um filho. É fácil viver na ilusão de família perfeita, onde todos são educados e unidos, se amam e se cuidam mutuamente e todos os dias são como os comerciais de Doriana. Difícil é assumir que por ser diferente eu posso não gostar de você e não te apoiar por isso.
Justo? Eu não acho que seja justo, afinal eles são meus pais, são aqueles que a gente espera apoio incondicional para o resto da vida. Mas o que é justo nesta vida? Todos temos nossos problemas, nossos limites, nossos gostos e prefêrencias. E como já dizia Renato Russo: "Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo. São crianças como você, o que você vai ser quando você crescer?"